quarta-feira, 2 de maio de 2012

Bemposta

A senhora Basilia pede-me sempre coisas mas até hoje tenho-me
 conseguido escapar com umas graçolas.
 "Não tenho arroz mas venho carregado de boa disposição." Disse-lhe
 eu. Sempre que a senhora se ri, eu sinto que já ganhei o dia.
 O regresso às dez comunidades começou hoje com a visita à Bemposta. Estava um tempo terrível, com chuva e frio como eu já me tinha esquecido mas isso só fez as pessoas estarem mais unidas e acolhedoras.
 Visitar uma comunidade é algo que eu recomendo vivamente mas é preciso ter atenção a um facto muito importante: Entrar numa comunidade em São Tomé é o mesmo que entrar directamente na sala quando uma família muito grande está presente. Deve ser feito com respeito e consideração.
 Felizmente que como já fiz isto umas quantas vezes já me habituei a todos os olhares que gritam "quem é o branco...?" mas lembro-me perfeitamente que da primeira vez só sentia que não era bem vindo e que me devia era ir embora e depressa!
 Acho que as regras de conduta são as mesmas que em qualquer lugar. Sejam bem-educados, falem abertamente com a primeira pessoa que virem à frente, nem que seja apenas para cumprimentar. Mandem abaixo aquela barreira desconfortável com um sonoro "Olá, tudo fixe?" e um grande sorriso e pronto, é tudo o que é preciso para serem bem recebidos em qualquer lado.

Zu, a mulher do Nity, um dos assistentes do projecto. Está à porta da cozinha e ao lado está o galinheiro.
  As comunidades em São Tomé oferecem algo que sinto que se está a perder completamente no nosso mundo. Não é uma coisa palpável certamente, nem sequer uma experiência excitante. É algo extremamente simples e profundo. Uma espécie de sensação de pertença que só senti no Egipto mas para isso tive que lá viver quatro meses. Basta sentar-nos ao lado de alguém, com o rabo no cimento sujo e molhado que isto a que me refiro começará a surgir aos poucos - mas é preciso estarem bem atentos... Se só virem sujidade e "miséria" isto de que estou a falar vai passar-vos completamente ao lado... Eles brincam uns com os outros, gozam, provocam-se, conhecem-se tão bem como irmãos... e muitos são mesmo família... acho que a coisa a que me refiro é a facilidade de aceitar um estranho no seu meio. Acho que é isso que verdadeiramente distingue estas pessoas.

Calacha Vs Jiló
 Eu venho carregado de boa disposição mas também trago um tabuleiro de xadrez! Desde a segunda volta às comunidades que tenho dedicado boa parte do meu tempo a ensinar toda a gente (especialmente os mais novos) a jogar xadrez. Faço isto porque acredito que é a melhor forma de evitar que os miúdos queimem o seu tempo a caçar os vizinhos passaritos ao mesmo tempo que os ajuda a puxarem pela cabeça e a formarem planos.




 Não venham a São Tomé sem visitar umas quantas comunidades e quando as visitarem, saiam do carro e falem com as pessoas. Sentem-se um pouco no chão, aceitem um pouco de vinho de palma, sem pressa, leve-leve, sintam o que vos rodeia que prometo que vão aprender alguma coisa e no final vão-se sentir realmente bem com a vossa decisão.


1 comentários:

  1. Espero bem que mantenhas esse olhar optimista, porque não deve ser nada fácil. Até a Zu parece feliz, habituada como está...

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